Projeto “Dramaturgia do Silêncio”: Primeiro desafio da Casa
A Dramaturgia do Silêncio ou a arte da construção do dramático sem palavras
O primeiro projeto/desafio da Casa Brasileira de Dramaturgia é a construção de uma dramaturgia que prescinda de palavras, nominada pela dramaturga Cintia Alves de “Dramaturgia do Silêncio”. A proposta surgiu a partir da parceria com a Coisolândia 2 – Lugar de Silêncio e Sons, projeto selecionado pelo edital de Mediação em Arte do Centro Cultural São Paulo e que atua com a Cultura Surda.
Apresentação do projeto: “Dramaturgia do Silêncio”
Os trabalhos da Casa estão dimensionados de acordo com desafios e, para o nosso “debut”, organizamos um dogma, que precisa ser experimentado religiosamente por todxs os sete inquilinxs:
- Escrever um roteiro cujos diálogos entre as personagens não tenham palavras;
- Não pode ser usada a mímica e é necessário partir de uma perspectiva realista;
- Todas as locações acontecerão nas dependências do Centro Cultural São Paulo;
- Filmagem com câmera fotográfica ou celular;
- Produções enxutíssimas contando apenas com o expertise dos inquilinxs da Casa;
- Não pode ser usada trilha ou qualquer recurso sonoro que, de alguma forma, coadjuve na comunicação da história;
- Os personagens principais são Surdxs;
- Produzir um curtíssima metragem (máximo de 3 minutos) com esses elementos.
Para o início do estudo, a ideia era que prestássemos atenção em cenas cotidianas que tivessem potencial comunicativo, ou seja, que fossem capazes de sugerir uma fábula (história) sem que fossem proferidas palavras.
Nota-se aí que a construção de um texto dramático no qual o diálogo prescinda de palavras, partindo de um ponto de vista realista, propõe uma potencialização do poder de comunicação da ação física do personagem bem como de todas as imagens que fazem parte da mesma ação.
No verbete AÇÃO do Dicionário de Teatro, de Patrice Pavis, é apresentada a seguinte definição:
“Ação é a sequência de acontecimentos cênicos essencialmente produzidos em função do comportamento das personagens, a ação é, ao mesmo tempo, concretamente, o conjunto dos processos de transformações visíveis em cena e, no nível das personagens, o que caracteriza as suas modificações psicológicas ou morais”.
O que se subentende é que, em um texto cuja personagem fala, ela pode sugerir, por meio da palavra, todo o contexto psicológico no qual está inserida, todas as relações intratextuais, noções de transcorrer do tempo etc, no entanto, à medida que não existe fala, o expectador “lê” apenas as imagens: uma mulher que passa com um livro embaixo do braço é apenas isso, em uma cena sem palavras. Para que mais significados sejam unidos a esse significante, é necessária a justaposição de novos signos visuais. Isso, por si, acaba por “abrir” a obra à leitura do espectador uma vez que, a leitura de imagens não comunica de forma absoluta, mas depende das experiências de cada espectador. Porque, continuando a definição de Pavis, as transformações invisíveis das personagens acontecem internamente em casa espectador.
O desafio proposto nessa busca pela Dramaturgia do Silêncio é criar um alinhamento entre alinhamento nessa comunicação. Os vídeos estarão disponíveis no canal do Youtube da Casa a partir de janeiro.
Alea jacta est!
Cena do curta-metragem “Chave do Livro”, roteiro criado por Cintia Alves para a pesquisa da Dramaturgia do Silêncio